Ter uma rotina agitada e cheia de responsabilidades se tornou algo tão comum e banal que o descanso e o tempo livre para fazer o que gosta parecem não ser mais um direito válido. “Trabalhe enquanto eles dormem”, “Dou conta de tudo sozinho”… Essas e outras frases que romantizam a sobrecarga podem estar por trás de alguém que esteja passando por sofrimento emocional e que pode chegar, em breve, à exaustão mental.
Uma pesquisa divulgada pela Fundação Getulio Vargas (FGV) mostra que 43% dos entrevistados dizem que estão com sobrecarga de trabalho e 31% sofrem pressão por resultados e metas. Mas não é só no ambiente corporativo que isso acontece. Também é comum para quem é responsável por outros adultos que precisam de cuidados especiais e pais que cuidam de suas crianças.
Já um levantamento realizado pelo grupo Consumoteca com 1.086 brasileiros aponta que pelo menos seis em cada 10 participantes afirmaram sentir falta de apoio no dia a dia com as crianças e sobrecarregados, pelo acúmulo de trabalhos — o que engloba emprego e cuidados com os filhos e a casa.
Luiz Mafle, psicólogo, professor e doutor em psicologia pela PUC Minas e Universidade de Genebra, explica que a sobrecarga acontece quando temos diversas tarefas para realizar ao mesmo tempo, mas não diz respeito, necessariamente, a ter muitas coisas a serem feitas.
Ela também pode ocorrer quando estamos muito preocupados com uma atividade. “Por exemplo, quando é preciso tomar conta de alguém que tem uma necessidade e precisa estar presente o tempo todo, com cuidados, isso gera uma sobrecarga. Ou, então, um trabalho que, a todo momento, apresente uma urgência, o tempo todo você precisa checar, verificar, lembrar. Tudo isso pode gerar uma sobrecarga. Na hora que essas duas situações se acumulam, é uma bomba. Nesse momento, o nível de estresse e depressão pode dobrar ou quadruplicar”, afirma o especialista.
A seguir, o profissional lista 10 sinais que demonstram que você está se sentindo sobrecarregado:
1 – Tudo à flor da pele
Uma das principais características de quem está tentando lidar com diversas tarefas é a irritabilidade. De acordo com o psicólogo, a pessoa acaba ficando muito sensível, e isso pode surgir na forma de agressão. “Ela fica muito reativa ou, qualquer coisa que digam, ela chora. Isso acontece porque ela está tentando se livrar de qualquer outra demanda que possa surgir”, alerta Luiz.
2 – Insônia
Com tantas tarefas e a cabeça cheia de pensamentos, normalmente, quem está sobrecarregado começa a ter perda de sono. “Com o sono desequilibrado, o cansaço se torna ainda mais frequente. Além disso, começa a gerar impactos na rotina e também na saúde física”, conta o especialista.
3 – Perda de rendimento no trabalho
O excesso de preocupações e tarefas também prejudica o foco e a atenção no trabalho. “Normalmente, quem está sobrecarregado se sente desmotivado e com dificuldades de concentração, o que pode impactar diretamente na rotina profissional. Além disso, a irritabilidade e os sentimentos à flor da pele podem provocar conflitos entre os colegas”, adverte o profissional.
O excesso de preocupações e tarefas também prejudica o foco e a atenção no trabalho
4 – Aumento ou perda de apetite
A sobrecarga emocional também atinge a forma como cuidamos do nosso corpo e alimentação. “É possível ver pessoas que esquecem de comer e outras que descontam os sentimentos na alimentação. Necessitamos olhar com cuidado e entender por que está acontecendo esse desequilíbrio na alimentação. Pode ser um sinal que o corpo e a mente precisam de ajuda”, fala o psicólogo.
5 – Sentimento de fracasso
De acordo com o especialista, com tantas atividades sob o controle da pessoa, ela, muitas vezes, não consegue dar conta de tudo e se sente frustrada e com o sentimento de desamparo. “Ela começa a abraçar o mundo e isso a sufoca e frustra”, diz ele.
6 – Ansiedade
Quando vivemos além dos nossos limites, normalmente, também estamos em estado de ansiedade. “O cansaço mental pode vir acompanhado de dores no peito, falta de motivação e crises de ansiedade. Com tantas preocupações, é comum que os indivíduos fiquem mais ansiosos e comecem a criar cenários em sua cabeça, o que pode aumentar ainda mais os gatilhos para ansiedade”, lembra Luiz.
Quando vivemos além dos nossos limites, normalmente, também estamos em estado de ansiedade
7 – Depressão
A sobrecarga, quando vivida em grandes períodos, é um dos principais fatores que causam ansiedade e depressão. Por mais que períodos cansativos sejam normais, a pessoa, ao atingir o objetivo que ela almejava, não fica mais sobrecarregada.
Quando essa sobrecarga é vivida por longos períodos, a pessoa começa a se sentir frustrada e a vida começa a se paralisar, porque não sobra espaço para outros crescimentos e desenvolvimentos, e vira uma rotina muito pesada. “O indivíduo vai se sentindo pior, cansado, sem energia, não consegue ter uma vida pessoal nem um autocuidado, vai se sentindo desvalorizado, abandonado, e isso aumenta o nível de ansiedade e depressão”, destaca o professor.
8 – Isolamento
Em um nível mais avançado de sobrecarga, o indivíduo começa a se fechar e isolar, não tendo contato com os amigos e familiares. “Ela se fecha e não conta com mais ninguém, quer se isolar. Tudo parece virar uma exigência, então ela acha que qualquer outra demanda vira uma tarefa. Assim começam os problemas nas relações”, expõe o psicólogo.
9 – Deixar o autocuidado de lado
Com tantas tarefas, é natural que alguém não consiga ter um tempo para olhar para si mesmo. “Normalmente, perde o prazer em se cuidar, se arrumar e, às vezes, deixa de lado até os atos de higiene. Não se olha mais com carinho e atenção, porque a exaustão tomou conta e o autocuidado se torna mais uma tarefa em meio a tantas”, revela Luiz Mafle.
Com tantas tarefas, é natural que alguém não consiga ter um tempo para olhar para si mesmo
10 – Não buscar ajuda
O profissional enfatiza o quanto é importante buscar ajuda e se cuidar, caso se sinta sobrecarregado. “Uma pessoa com sobrecarga tira muito proveito da psicoterapia, porque ela vai compreender quais os motivos que estão a levando a assumir todas essas responsabilidades de uma vez e, provavelmente sozinha, além de o que ela sente que precisa compensar, assumindo tanta responsabilidade para si que não pode compartilhar com outras pessoas”, frisa ele.
Ainda de acordo com o especialista, muitas vezes o indivíduo sobrecarregado se sente menos valorizado. Então, para mostrar seu valor, busca assumir muitas tarefas, para que as outras pessoas vejam que ela tem muita capacidade.
“A psicoterapia é fundamental para ver até que ponto a responsabilidade deve ser assumida e até que ponto ela deve ser compartilhada com alguém. Porque, muitas vezes, essas crenças centrais de não ser amado ou de não ter valor nos fazem tomar decisões e ter atitudes e pensamentos que nos colocam em enrascadas, e acabamos não vendo mais saídas”, fala o psicólogo. O conselho, então, é fazer terapia e procurar ajuda profissional.
